Os evangélicos têm tido uma maior visibilidade neste crescimento, mas os muçulmanos estão, também, a registar um aumento, principalmente na zona de Lisboa.

Apesar desta alteração paulatina, Portugal “tem uma situação que é aberta e particularmente respeitosa sobre o fenómeno religioso”, reconhece o secretário-geral da Associação Internacional para a Defesa da Liberdade Religiosa (AIDLR), Paulo Macedo.

Adventista do Sétimo Dia, de 46 anos, Paulo Macedo sublinha a diversidade religiosa que se vive em Portugal: “as religiões, hoje, têm pessoas de todas as proveniências, de todas as migrações”.

“Temos cristãos vindos de África, temos pessoas que vêm da Ásia, que são também cristãs. Temos portugueses que se converteram a religiões orientais. Portanto, não devemos ligar estas questões da nacionalidade ou mesmo da etnia às religiões. Mas, de facto, nos últimos 20 anos temos algo que está a mudar aquilo que é o tecido religioso português”, afirma.

Para este responsável, os portugueses estavam “habituados a que as pessoas que viriam, por exemplo, muçulmanos e hindus, antes de serem muçulmanos ou hindus já tinham nascido portugueses, porque vinham das ex-colónias. Não é o que está a acontecer neste momento”.

Para esta convivência tranquila, Paulo Macedo aponta fatores como os portugueses estarem habituados, “há muito tempo, a lidar com pessoas de tradições e culturas diferentes”, a par do “conforto que as comunidades religiosas começaram a viver com a Lei da Liberdade Religiosa”.

“Se nós formos estudar ou verificar aquilo que foi a construção da Lei da Liberdade Religiosa, houve uma grande preocupação das entidades públicas em fazerem uma lei que fosse para as comunidades, mas também com as comunidades, em que fossem ouvidas, em que houvesse uma sensibilidade relativamente àquilo que era a problemática dessas comunidades”, reconhece o secretário-geral da AIDLR, acrescentando que “a lei veio trazer uma oportunidade para as comunidades religiosas poderem sentir-se confortáveis para iniciar um diálogo com as autoridades públicas e umas com as outras também”.

Sublinhando o papel de Vera Jardim, atual presidente da Comissão da Liberdade Religiosa — “quase uma figura tutelar em todo o processo” — Paulo Macedo admite que a legislação pode sempre ser aperfeiçoada e aponta alguns exemplos, como o das capelanias hospitalares, onde “há hospitais que têm feito um esforço extraordinário de fazer com que os capelães possam ter o direito a estar com os doentes que pedem (…), mas há ainda muitos hospitais onde isso não é possível, muito por desconhecimento da própria lei em alguns casos”.

Ou a questão da educação religiosa, com as oportunidades a existirem, “mas muitas vezes não é fácil conseguir, por exemplo, os 10 alunos mínimos para poder ser proporcionado o espaço e uma hora para que eles possam reunir-se”.

Problemas pontuais com o descanso em dia religioso ou para fazer as orações em dia de trabalho, são outros assuntos que levam a que “devamos sempre continuar atentos (…), sabendo que vai haver sempre problemas, mas com uma lei que é realmente bastante profunda e muito aberta, uma sociedade que esteja disposta a continuar a respeitar estes princípios”.

Sobre o privilégio que a Igreja Católica gozará na sociedade portuguesa, Paulo Macedo é claro: “até 2001, até à aprovação da lei, (…) havia uma desigualdade, uma falta de equidade entre as comunidades religiosas, comparando [com] aquilo que era a lei de 1971, portanto pré-constituição de 1976, e [com] a Concordata assinada pelo Estado português em 1940”.

“O que aconteceu foi um esforço notável, que tem pouco paralelo em muitos países”, e que foi no sentido de, “quer aos membros das comunidades religiosas, quer às comunidades religiosas, procurar um equilíbrio entre aquilo que eram os direitos conferidos à Igreja Católica na Concordata para as outras comunidades religiosas, através da Lei de Liberdade Religiosa. Esse equilíbrio foi importante. E depois, houve a revisão da Concordata em 2004, que também produziu diferenças substanciais”, explica.

E, para Paulo Macedo, “embora a Igreja Católica, hoje, continue a beneficiar de um estatuto concordatário, que é um acordo entre dois Estados, a Lei da Liberdade Religiosa conferiu praticamente os mesmos direitos [às restantes confissões], incluindo os acordos”.

Já quanto às questões de protocolo, que muitas vezes levam a que em cerimónias oficiais se vejam representantes da Igreja Católica, mas não de outras confissões, este responsável considera que, se se olhar “para o princípio da separação, sob o ponto de vista estrito, de facto há uma diferenciação, mas é uma diferenciação que não retira direitos individuais nem retira direitos às comunidades, naquilo que são os seus direitos fundamentais”.

“E também é verdade que a cultura e o peso das próprias instituições influenciam aquilo que é a história de um país. E o protocolo reflete também aquilo que é a história de um país”, acrescenta, chamando a atenção para o gesto agregador do Presidente da República, no início dos seus dois mandatos, ao realizar cerimónias com a presença das diferentes confissões religiosas.